segunda-feira, 15 de junho de 2009

ADEUS GENERAL MOTORS




*Por Michael Moore



Escrevo na manhã que marca o fim da toda-poderosaGeneral Motors. Quandochegar a noite, o Presidente dos Estados Unidos teráoficializado o ato: aGeneral Motors, como conhecemos, terá chegado ao fim.
Estou sentado aqui na cidade natal da GM, em Flint,Michigan, rodeado poramigos e familiares cheios de ansiedade a respeito dofuturo da GM e dacidade. 40% das casas e estabelecimentos comerciaisestão abandonados poraqui. Imagine o que seria se você vivesse em umacidade onde uma a cadaduas casas estão vazias. Como você se sentiria?
É com triste ironia que a empresa que inventou a"obsolescênciaprogramada"
- a decisão de construir carros que se destroem empoucos anos, assim oconsumidor tem que comprar outro - tenha se tornadoela mesma obsoleta.
Ela se recusou a construir os carros que o públicoqueria, com baixo consumode combustível, confortáveis e seguros. Ah, e que nãocaíssem aos pedaçosdepois de dois anos. A GM lutou aguerridamente contratodas as formas deregulação ambiental e de segurança. Seus executivosarrogantementeignoraram os "inferiores" carros japoneses e alemães,carros que poderiam se tornarum padrão para os compradores de automóveis. A GMainda lutou contra otrabalho sindicalizado, demitindo milhares deempregados apenas para "melhorar" suaprodutividade a curto prazo.
No começo da década de 80, quando a GM estava obtendolucros recordes,milhares de postos de trabalho foram movidos para oMéxico e outrospaíses, destruindo as vidas de dezenas de milhares detrabalhadores americanos. Aestupidez dessa política foi que, ao eliminar a rendade tantas famíliasamericanas, eles eliminaram também uma parte doscompradores de carros. AHistória irá registrar esse momento da mesma maneiraque registrou a LinhaMaginot francesa, ou o envenenamento do sistema deabastecimento de águados antigos romanos, que colocaram chumbo em seusaquedutos.
Pois estamos aqui no leito de morte da GeneralMotors. O corpo ainda nãoestá frio e eu (ouso dizer) estou adorando. Não setrata do prazer davingança contra uma corporação que destruiu a minhacidade natal, trazendomiséria, desestruturação familiar, debilitação físicae mental, alcoolismoe dependência por drogas para as pessoas quecresceram junto comigo. Tambémnão sinto prazer sabendo que mais de 21 miltrabalhadores da GM serãoinformados que eles também perderam o emprego.
Mas você, eu e o resto dos EUA somos donos de umamontadora de carros! Eusei, eu sei - quem no planeta Terra quer ser dono deuma empresa decarros?Quem entre nós quer ver 50 bilhões de dólares deimpostos jogados no ralopara tentar salvar a GM? Vamos ser claros a respeitodisso: a única formade salvar a GM é matar a GM. Salvar a preciosainfra-estrutura industrial, noentanto, é outra conversa e deve ser prioridademáxima.
Se permitirmos o fechamento das fábricas,perceberemos que elas poderiamter sido responsáveis pela construção dos sistemas deenergia alternativos quehoje tanto precisamos. E quando nos dermos conta quea melhor forma de nostransportarmos é sobre bondes, trens-bala e ônibuslimpos, como faremospara reconstruir essa infra-estrutura se deixamosmorrer toda a nossacapacidade industrial e a mão-de-obra especializada?
Já que a GM será "reorganizada" pelo governo federale pela corte defalências, aqui vai uma sugestão ao Presidente Obama,para o bem dostrabalhadores, da GM, das comunidades e da nação.20 anos atrás eu fiz ofilme "Roger & Eu", onde tentava alertar as pessoassobre o futuro da GM.Se as estruturas de poder e os comentaristaspolíticos tivessem ouvido,talvez boa parte do que está acontecendo agorapudesse ter sido evitada. Baseadonesse histórico, solicito que a seguinte ideia sejaconsiderada:

1. Assim como o Presidente Roosevelt fez depois doataque a Pearl Harbor,o Presidente (Obama) deve dizer à nação que estamosem guerra e que devemosimediatamente converter nossas fábricas de carros emindústrias detransporte coletivo e veículos que usem energiaalternativa. Em 1942,depois de alguns meses, a GM interrompeu sua produçãode automóveis e adaptousuas linhas de montagem para construir aviões,tanques e metralhadoras. Estaconversão não levou muito tempo. Todos apoiaram. E osnazistas foramderrotados.
Estamos agora em um tipo diferente de guerra - umaguerra que nós travamoscontra o ecossistema, conduzida pelos nossos líderescorporativos. Essaguerra tem duas frentes. Uma está em Detroit. Osprodutos das fábricas daGM, Ford e Chrysler constituem hoje verdadeiras armasde destruição emmassa, responsáveis pelas mudanças climáticas e peloderretimento dacalota polar.
As coisas que chamamos de "carros" podem serdivertidas de dirigir, mas seassemelham a adagas espetadas no coração da MãeNatureza. Continuar aconstruir essas "coisas" irá levar à ruína a nossaespécie e boa parte doplaneta.
A outra frente desta guerra está sendo bancada pelaindústria do petróleocontra você e eu. Eles estão comprometidos a extrairtodo o petróleolocalizado debaixo da terra. Eles sabem que estão"chupando até o caroço".
E como os madeireiros que ficaram milionários nocomeço do século 20, elesnão estão nem aí para as futuras gerações.
Os barões do petróleo não estão contando ao público oque sabem serverdade:que temos apenas mais algumas décadas de petróleo noplaneta. À medida queesse dia se aproxima, é bom estar preparado para osurgimento de pessoasdispostas a matar e serem mortas por um litro degasolina.
Agora que o Presidente Obama tem o controle da GM,deve imediatamenteconverter suas fábricas para novos e necessáriosusos.

2. Não coloque mais US$30 bilhões nos cofres da GMpara que ela continue afabricar carros. Em vez disso, use este dinheiro paramanter a força detrabalho empregada, assim eles poderão começar aconstruir os meios detransporte do século XXI.

3. Anuncie que teremos trens-bala cruzando o país emcinco anos. O Japãoestá celebrando o 45o aniversário do seu primeirotrem bala este ano.Agora eles já têm dezenas. A velocidade média:265km/h. Média de atrasos nostrens: 30 segundos. Eles já têm esses trens há quase5 décadas e nós nãotemos sequer um! O fato de já existir tecnologiacapaz de nos transportarde Nova Iorque até Los Angeles em 17 horas de trem eque esta tecnologia nãotenha sido usada é algo criminoso. Vamos contratar osdesempregados paraconstruir linhas de trem por todo o país. De Chicagoaté Detroit em menosde 2 horas. De Miami a Washington em menos de 7horas. Denver a Dallas em5h30.Isso pode ser feito agora.

4. Comece um programa para instalar linhas de bondes(veículos leves sobretrilhos) em todas as nossas cidades de tamanho médio.Construa esses trensnas fábricas da GM. E contrate mão-de-obra local parainstalar e manteresse sistema funcionando.

5. Para as pessoas nas áreas rurais não servidaspelas linhas de bonde,faça com que as fábricas da GM construam ônibusenergeticamente eficientes elimpos.

6. Por enquanto, algumas destas fábricas podemproduzir carros híbridos ouelétricos (e suas baterias). Levará algum tempo paraque as pessoas seacostumem às novas formas de se transportar, então seainda teremosautomóveis, que eles sejam melhores do que os atuais.Podemos começar aconstruir tudo isso nos próximos meses (não acrediteem quem lhe disserque a adaptação das fábricas levará alguns anos -isso não é verdade)

7. Transforme algumas das fábricas abandonadas da GMem espaços paramoinhos de vento, painéis solares e outras formas deenergia alternativa.Precisamos de milhares de painéis solaresimediatamente. E temos mão-de-obracapacitada a construí-los.

8. Dê incentivos fiscais àqueles que usem carroshíbridos, ônibus outrens.Também incentive os que convertem suas casas parausar energiaalternativa.

9. Para ajudar a financiar este projeto, coloque US$2,00 de imposto emcada galão de gasolina. Isso irá fazer com que mais emais pessoas convertamseus carros para modelos mais econômicos ou passem ausar as novas linhas debondes que os antigos fabricantes de automóveis irãoconstruir.
Bom, esse é um começo. Mas por favor, não salve aGeneral Motors, já queuma versão reduzida da companhia não fará nada a nãoser construir mais Chevysou Cadillacs. Isso não é uma solução de longo prazo. Cem anos atrás, os fundadores da General Motorsconvenceram o mundo adesistir dos cavalos e carroças por uma nova forma delocomoção. Agora éhora de dizermos adeus ao motor a combustão. Pareceque ele nos serviu bemdurante algum tempo. Nós aproveitamos restaurantesdrive-thru. Nós fizemossexo no banco da frente - e no de trás também. Nósassistimos filmes emcinemas drive-in, fomos à corridas de Nascar ao redordo país e vimos o Oceano Pacífico pela primeira vez através da janelade um carro na Highway1. E agora isso chegou ao fim. É um novo dia e umnovo século. OPresidente - e os sindicatos dos trabalhadores daindústria automobilística - devemaproveitar esse momento para fazer uma bela limonadacom este limão amargoe triste.
Ontem, a último sobrevivente do Titanic morreu. Elaescapou da morte certanaquela noite e viveu por mais 97 anos.
Nós podemos sobreviver ao nosso Titanic em todas as"Flint - Michigans"deste país. 60% da General Motors é nossa. E eu achoque nós podemos fazerum trabalho melhor.

Marcia A. Estevão dos SantosPetrobras/Comunicação Institucional

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